terça-feira, 24 de setembro de 2019

DO PROVEITO

Começo mais uma vez a escrever um poema...
Se algo mais, não sei! 
Mas sempre experimenta uma debilidade:

A dizer que começo... Nada inicio!
Retomo o cansado uso das palavras 
e o lugar-comum que é a ideia do poema debruçar-se sobre o poema. 
- Vazio confesso?

Começo?! 
Mais factível é que continuo a regar estas flores,
que são as palavras,
que só dão nos vasos,
que são as cabeças...
Flores que ensaiam plástico e
à realidade, insinuam mais de deserto que florestas.

Se olhas bem, 
há também no poema a expectativa dada por certa
e sequer questionada
de que terminarei o poema!
Erro, então, de que há um fim;
outro, de que sou sujeito e autor 
disto que me atravanca estar dormindo.


Um proveito: 
O poema é sempre uma fuga das palavras 
do campo de concentração que são as teses 
as notícias intencionadas, 
que são sempre más notícias.

Enfim, aqui a palavra descansa do objetivo, 
estica-se toda de férias na conotação.
Não pesa de trazer soluções, 
pois sequer esculturou um problema
do barro mole do mundo e da vida.

Mas, autor?! Eu?! 
Nem eu, nem esses seus olhos correntes,
quais, se sabem nadar, não se deixam arrastar livremente
e sequer experimentam, deste fluxo, a profundidade.
Fôlego é preciso para senti-la e sair vivo.

Fato é que o poema brota de mim dúbio, 
como se a partir de uma semente investida:
As curvas que serão o caule e suas ramificações, 
estão a mercê de uma luz que se esgueire pelas frestas dos meus sentidos...

Os caminhos que descreve a planta aqui crescida, 
imprimem implicitamente, 
ante aos que padecem de consciência, 
mais do que as que realizou, 
as infindas curvas e bifurcações que não foram... 
Lançadas ao impossível!
Infindável (i)matéria-prima de especulações,
de consciências insatisfeitas em duelo com o real.


A poesia de mim como a planta de um vaso...
Cerceada por corredores, 
tolhida pela sombra dos aposentos, 
a dar pistas de um tempo inerte...
mas sem esverdecer e sem fazer dos limites 
sofrimento.
Insaciável da luz dos olhos
e da água dos sentidos,
se desdobra deste quarto 
para vazar às janelas e ganhar o mundo...
Pálida planta inédita,
regida pela intenção corriqueira de tudo que vive:
dominar o que alcança.
E isto nunca acaba,
pois para o que vê, os braços são curtos,
para o que imagina, a visão é deficiente.

De mim, sim! O processo planta... 
Para ti, que papel?
Plano, chato, reto, seco, dobrável, descartável, guardanapo...
- Olhos e tratos! 
Outros mil me perfaçam...
A poesia há de ter com os alheios 
também o que plantas têm com as estações do ano:
deita-lhes flores, frutos e seca, se acastanhando...
Quiçá crepite pisada na pressa do passeio,
fim costumeiro das nobrezas.
E assim, nem exista mais em seu corpo pleno 
"começado e terminado por este sujeito-autor"...
Ainda assim - morta, quebrada - goza mais do que todas as hipóteses, quais ela não deu luz:
Não pode mais ser suposta, concorre a ser lembrada, 
é indestrutível como a matéria.
Não desaparece, apenas se transforma:
Pois não será de outras vindas adubo e luz?

sexta-feira, 13 de setembro de 2019

Do amor no jogo

Se a gente ainda vai ser prazer no outro, 
também seremos a dor, depois, um pouco. 
pois tudo se vai, mais cedo ou mais tarde, 
da herança do amor à lembrança que arde.

Onde sorri também chorei demais!
Com quem sofri também diverti. 
Também penei em que fui bom rapaz.

De certo que se entre ruínas, 
a guerra finda funda a paz,
desertos feitos do que se desfaz
é a dura sina que me fez capaz 

de compor castelos de novo... 
despir razões, redescobrir o fogo, 
reinventar a roda pra girar
a sorte do amor no jogo.

quarta-feira, 4 de setembro de 2019

no mundo que eu vivo o diabo joga malabares no vermelho: sujo, miserável, faminto - e deus advoga contra!