quinta-feira, 14 de maio de 2020

GÊNESE DIVINA

O que um homem pode me dar é produto vencido.
A pior mendicância é a de fé!
Pois só reclama crença o débil de sentido.

Em lugar de Diógenes,
aproveito a sombra de Alexandre
pra evitar assunto.
E gozo em seguida o sol de sua ausência.
A plenitude só deriva de acordar com o acontecido.

Não me exporto para promessas nem sonhos...

Quando procurei irmandade para minhas imoralidades entre os homens,
encontrei-os bem vestidos...
Achei na sinceridade aquilo que me distinguia, se seu fruto não encontrando estação dá-se amargo, então só me entende o vício.
O mundo dos homens não passa de um anúncio de culpas,
um cinema a dimensionar a enorme impotência de ser indivíduo.
O tempo todo a requisitar-me imperioso, iluminado e sonoro para tudo a que sou robustamente incapaz.


Para mim já não há "nós",
exausto e nauseado da procura do comum, resigno-me ao singular.


Se me estendo no branco silencioso, não é à toa... pois sim!
Se escrevo, é que só no incógnito ouso supor compreensão.
E se ainda há conversas pra além de frivolidades, é que não ostento suficiente pudor de estar enganado. Sei, aliás, como quem vem com os pés machucados de realidades pedregosas, da necessidade de se folgar em ilusões.

Na constante impossibilidade do par, adquiriu-me este orgulho pelo ímpar, converteu-me a supremacia do indivisível.

As conversas são apenas palavras que  inaptas ao poema não se fazem questão e se atiram subversivas.
Errado diagnóstico: meus versos não são sintomas de conversas deficientes, mas o flagrante das debilidades românticas.
Damos no silêncio - como rio ao mar -  por qualquer via - o poema ou o outro. Um destinatário ou interlocutor é apenas a parte enfadonha na natureza do curso.

Não tenho nenhum conselho...
Se és modificável, vindo do barro, o acaso  te saiba o artesanato!
Quanto a mim, que não pretendo nem mesmo a forma que assumo, de ti não farei nem esboço.
Refresca-te em meu despropósito!
Não me apetece, por senso estético ou por qualquer outro, conduzir-te ou te adornar.
O homem é, desde mim, uma matéria-prima do nada.
Eis o destino, que só de "quando" faz mistério.

Não faço do outro nenhum ideal: plateia ou promotor, para ter por ele ainda algum interesse.
Não sou mais criança a tal ponto.

Também não vim salvar nada do que é possivel.
Nem etiquetar o mundo com afetados moralismos. Reparar-lhe indecências?! Indecência é somar ao barulho.
Se respondo "bom dia!" é para que não me criem caso e não se atrevam a comigo mesmo, em minha presença, me fazerem assunto.

Insuficiente para ambos, dispenso o elogio e a crítica com "muito obrigado!", palavras mágicas não fariam melhor, pois mais útil que mover pedras é encerrar assuntos.
Quando digo o inevitável, tal um estertor, que me importam enquadramentos estéticos alheios, contemporâneos ou futuros?
É o que posso, o que devo... De confrontá-los por este ou aquele adjetivo, renuncio.

O verso é a folga que tiro de jogar-me fora em colóquios para que me jogue fora com elegância.
Não me desperdiço, porque não sou um funcionário...
Quem se descobre sem função e sem motivos ideológicos
não sofre tempo perdido.

Minha poesia é nula como a oração de um ateu:
mais vale pelo tempo a passar que enfeita, pondo-lhe palavras como se rabiolas em pipas que não acharão meninos...
Mais vale dissimular o vazio, do que carregar a um altar qualquer a tola esperança de ser ouvido.

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