sábado, 11 de agosto de 2018

DESCONSOLO NA AREIA

Fazendo conversa dos versos: Poesia: Consolo na praia (Carlos Drummond de Andrade)

mas, carlos...
eu não tenho um cão. 
e o coração resta - ido os amores
- regando olhos que se vão cada vez mais 
longe de verem encantos
na umidade refletem apáticos
o opaco concreto da cidade

blasé,
a última dramaticidade é a falta de drama.

a capacidade de amar
verteu-se numa espécie de condenação.
a todos amo como um animal
que afaga aos demais. 
com sentimento de desperdício 
de não sermos pedra
acaricio-os vida 
abraço e beijo-os como quem vela 
monumentos de tristeza.

ergo ondas entusiásticas
para apagar tudo numa febre conjunta...
apago as luzes, a lucidez machuca 
enlouquece de vez e não cura!
a enorme maioria esconde na estupidez
a intolerável parte dura.

a companhia ideal e a real que esperei
de pé em minha tolice
ambas quebraram o cristal da minha cabeça
e a memória sempre se corta nos cacos

ah, carlos!
fico repetindo a última estrofe
como quem procura o timbre daqueles versos
que aconselham:
que me precipite nas águas...
sinto-me nu na areia, sim!
mas não vejo água...
não parece praia
mas deserto!

no derradeiro já compreendo
obedeço meus pais:
"dorme, meu filho!"

e o resto me vem no sono:
...pois isto é só um fim gradativo, lento, contemplável, acontecendo...
quantos sabem a sorte da guilhotina?

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